Vitória de Mamdani em NY deve impor mudanças para democratas e republicanos: 'Jogo político muda de lógica', diz analista
05/11/2025
(Foto: Reprodução) Imigrante e muçulmano, Zohran Mamdani é eleito prefeito de Nova York
No primeiro discurso após vencer a eleição para a prefeitura de Nova York, o imigrante Zohran Mamdani disse, nesta ordem, que é "jovem, muçulmano e um democrata socialista".
"E o pior de tudo: eu me recuso a pedir desculpas por nenhuma dessas coisas", discursou.
Mamdani venceu o pleito na noite de terça-feira (4) levantando bandeiras pessoais e propostas de campanha que desafiam o governo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e até a cúpula de seu próprio partido.
Além de ser a primeira grande cidade a impor um muro ideológico a políticas do governo Trump em seu segundo mandato, a vitória, embora esperada, também indica que ambos os partidos repensem suas estratégias políticas para a corrida eleitoral da eleições legislativas do ano que vem, segundo especialistas ouvidos pelo g1.
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As principais propostas de governo apresentadas durante a campanha também foram duramente criticadas por Trump, por seus apoiadores e até por membros do Partido Democrata. Mamdani prometeu lutar contra o alto custo de vida de Nova York, a cidade mais cara para se viver de todos os Estados Unidos.
Disse que quer supermercados subvenciados pelo governo, creches públicas — um tipo de serviço praticamente inexistente nos EUA, onde a escola é gratuita apenas a partir do Ensino Fundamental — e congelamento do preço dos aluguéis, cujo preço médio alcançou os US$ 4 mil (cerca de R$ 21,5 mil) mensais este ano.
As promessas arrastaram milhões de eleitores nova-iorquinos da classe média da cidade, mas também fizeram especialistas e críticos levantarem dúvidas sobre se são viáveis, tanto no aspecto legal como no financeiro.
Ainda assim, a vitória de um candidato que levantou todas essas bandeiras mostra que "o jogo político muda de lógica", na avaliação da professora de Relações Internacionais da ESPM, Denilde Holzhacker.
“Esse cenário indica uma perda de popularidade de Trump e expõe as dificuldades internas do Partido Republicano. O jogo político muda de lógica e, provavelmente, levará os republicanos a repensarem suas estratégias eleitorais para o próximo ano", disse Holzhacker.
Mudanças para democratas
Zohran Mamdani , acena no palco após vencer a eleição para prefeito de Nova York em 2025
Reuters/Shannon Stapleton
Já os democratas, segundo a professora, começaram a perceber que o apoio a minorias pode ser a forma de se reorganizar, após a amarga derrota nas eleições presidenciais de 2024, quando Donald Trump derrotou a candidata do Partido Democrata, Kamala Harris, por ampla maioria.
“O destaque não está apenas na vitória em Nova York, mas também em Nova Jersey, Virgínia, Califórnia e nos assentos conquistados na Geórgia. Essas vitórias mostram que os democratas conseguiram se reorganizar em suas bases, recuperando o apoio de latinos, da comunidade negra e do eleitorado dos subúrbios, que voltou a votar em peso nessas regiões”, disse.
O desafio, agora, diz a Holzhacker, será levar o modelo para o espectro nacional — durante a campanha políticos conservadores e democratas disseram ao jornal "The New York Times" achar Mamdani muito de esquerda para atrair eleitores fora da cidade de Nova York, um reduto tradicionalmente progressista e democrata.
O professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), Artur Ituassu, concorda que a eleição de Mamdani responde a um contexto local e acha que não deve haver uma mudança de rumo nos partidos, mas sim uma diversificação de perfis de candidatos.
"Não há uma definição de um perfil único de candidato, mas o entendimento de que é preciso trabalhar (e ter tolerância) com perfis muito diversificados que vão estar em linha aos contextos específicos nos quais os candidatos disputam as eleições", disse, ao g1.
"Um perfil, por exemplo, como o do Mamdani não tem potencial algum no interior rural religioso dos Estados Unidos".
Em seus vídeos virais em suas badaladas redes sociais e em atos de campanha, Mamdani não hesitou durante a campanha em desafiar orientações de sua sigla. É bastante crítico, por exemplo, das ações de Israel na Faixa de Gaza, tocando em um ponto sensível para a grande população de judeus nova-iorquinos, eleitores clássicos democratas.
Isso fez com que Mamdani angariasse inimigos dentro de seu próprio partido — seu principal rival na corrida eleitoral foi outro democrata, o ex-governador de Nova York Andrew Cuomo, que concorreu de forma independente após perder as primárias do Partido Democrata para Mamdani.
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Vitória de Mamdani
Zohran Mamdani foi eleito prefeito de Nova York nesta terça-feira (4), segundo projeções da imprensa americana.
Com 90% dos votos apurados, Mamdani aparece em primeiro lugar com 50,4% dos votos. Em segundo está o ex-governador Andrew Cuomo, com 41,6%. O republicano Curtis Sliwa tem 7,1%. Diante deste cenário, a Associated Press projetou a vitória do democrata.
Aos 34 anos, ele fez história ao se tornar o primeiro prefeito eleito muçulmano a comandar a maior cidade dos Estados Unidos. Também será o líder mais jovem da cidade desde 1892, além do primeiro imigrante africano.
Nascido em Uganda, na África Oriental, Mamdani é filho de mãe indiana e pai ugandês. Mudou-se para os Estados Unidos aos 7 anos e construiu carreira política no estado de Nova York. Desde 2021, é deputado estadual.
Carismático e com linguagem próxima dos jovens, Mamdani virou um fenômeno meteórico dentro e fora de Nova York por meio de suas redes sociais — foi no Tiktok que anunciou, enquanto corria uma maratona, que se candidataria para o posto, apenas alguns meses atrás.
Semanas depois, conquistou as primárias democratas, derrotando o ex-governador Andrew Cuomo e provocando um "terremoto" político dentro de seu partido. Após a derrota, Cuomo decidiu concorrer como independente e recebeu o apoio do atual prefeito, Eric Adams, que desistiu de disputar a reeleição.
O presidente dos EUA, Donald Trump, também terminou apoiando Andrew Cuomo, em uma reviravolta política para tentar evitar a eleição de Mamdani, a quem chamou de "lunático comunista" durante a campanha.
“Prefiro muito mais ver um democrata com histórico de sucesso vencer do que um comunista sem experiência e com histórico de fracasso total”, disse, ao anunciar apoio a Cuomo.
Na terça-feira, após a vitória de Mandani, Trump afirmou que as pesquisas indicam que os republicanos perderam porque ele não estava nas urnas e por causa da paralisação no governo. Já a Casa Branca divulgou uma arte que imitava o brasão do time de basquete New York Knicks, com a frase “Trump é seu presidente” (veja imagem abaixo).
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Socialista e progressista, o agora prefeito eleito de Nova York também ganhou destaque nacional pelos discursos em defesa da Palestina e pelas críticas às ações de Israel na Faixa de Gaza durante a guerra contra o Hamas.
Em 2020, Mamdani gerou controvérsia ao chamar a polícia de Nova York de “racista” e de “grande ameaça à segurança pública”. O agora prefeito eleito pediu desculpas pelas declarações no mês passado, durante a reta final da campanha. Mas, ao longo dela, disse que a cidade tem policiais demais.
Mamdani começou a campanha mal posicionado nas pesquisas e cresceu aos poucos ao focar no alto custo de vida em Nova York, além de pautas sociais.
Mesmo enfrentando resistência dentro do próprio partido e ataques de Trump, Mamdani manteve o ritmo e liderou as pesquisas nas últimas semanas. Levantamentos mostravam vantagens que variavam de 5 a mais de 20 pontos percentuais sobre Cuomo.
Zohran Mamdani , acena para seus apoiadores após vencer a eleição para prefeito de Nova York em 2025
Reuters/Jeenah Moon
Andrew Cuomo e Zohran Mamdani durante debate eleitoral em 16 de outubro de 2025
Angelina Katsanis/Pool via REUTERS
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